15 de novembro de 2024
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Dúvidas, anseios, medos, frustrações. Esses e outros sentimentos são constantes em pacientes em Cuidados Paliativos, seja por parte dele próprio, ou de seus familiares. Dentro de um quadro que se altera de acordo com a evolução de cada condição clínica, os profissionais de psicologia cumprem a tarefa de facilitar a comunicação de assuntos ligados aos cuidados psicossociais e espirituais, entre vários outros temas que surgem para todos aqueles envolvidos.
Atuando há anos com supervisão e orientação para equipes multiprofissionais de Cuidados Paliativos e com trabalhos publicados acerca da compreensão da morte, Maria Julia Kovács, Professora Livre Docente do Instituto de Psicologia da USP (IPUSP), diz que a atuação do psicólogo no contexto do cuidado a quem enfrenta uma doença grave e ameaçadora à vida é amplo. “O profissional contribui com a facilitação do luto antecipatório, cuida do sofrimento existencial, auxilia na expressão dos sentimentos, favorece a comunicação entre pacientes, familiares e equipe de saúde, além de ser necessário que participe de todas ações a que forem convidados como membro da equipe multiprofissional de Cuidados Paliativos”, conta Kovács.
Psico-oncologista e membro do Comitê de Psicologia da Academia Nacional de Cuidados Paliativos (ANCP), Silvana Aquino complementa que todo esse trabalho pode ter início logo nos primeiros momentos do diagnóstico da doença. “(Pode acontecer) desde a fase inicial da doença elegível para a indicação da abordagem, até a fase final, com as questões pertinentes ao fim da vida. Considerando as diferentes modalidades onde a psicologia está inserida, o profissional poderá atuar à nível ambulatorial, de forma integrada com os demais profissionais da equipe multidisciplinar, com intervenções voltadas para o controle de sintomas agudos que podem exigir adaptações às perdas que levam ao sofrimento psíquico, especialmente no que se refere à compreensão do prognóstico”, explica Silvana, que ressalta a importância da entrada antecipada do psicólogo em um quadro clínico de pacientes em cuidados paliativos. “O que observamos é que quando é possível a psicologia atuar numa etapa mais precoce, isso contribui para uma melhor reorganização dos sentimentos envolvidos e para o enfrentamento dos desafios decorrentes de uma doença ameaçadora da vida”.
Escuta ativa e comunicação profissional
Pelo fato de estarem tão próximos às emoções daqueles envolvidos diretamente com os efeitos da doença que levou o paciente aos cuidados paliativos, os psicólogos tem de manter a comunicação alinhada à realidade de cada família inserida no processo. Para isso, é importante que estejam atentos aos aspectos sociais, culturais e às particularidades, funcionando como um elo de segurança no processo comunicativo para com a equipe de Cuidados Paliativos. “É tarefa essencial de todos os membros da equipe paliativista conhecer questões culturais, religiosas e de costumes de pacientes e familiares. O psicólogo pode ter um papel importante nesse conhecimento, como em momentos de encontros com pacientes e familiares, podendo transmitir adequadamente aos membros da equipe o que identificou”, diz Kovács.
Para Silvana, este trabalho de manter a comunicação como elemento que vai delinear a condução do cuidado passa por realizar escuta ativa. “O processo de comunicação demanda, antes de tudo, uma escuta ativa, compassiva e atenta às necessidades do paciente e de sua família, orientando os possíveis caminhos para o suporte. A comunicação envolve competências e habilidades técnicas que ajudam a dar contorno à interação que será estabelecida entre todos os envolvidos. É a principal ferramenta para a formação e manutenção do vínculo e instrumento para o trabalho interdisciplinar. ”, reforça a psico-oncologista.
Mesmo assim, os psicólogos podem ter obstáculos a serem superados oriundos de mais de uma fonte. Maria Julia Kovács exemplifica. “Os desafios podem envolver questões do paciente, dos familiares e também da instituição. Uma dessas partes pode não valorizar o trabalho dos Cuidados Paliativos, não o considerar prioritário”. Silvana Aquino faz uma relação com a quebra do vínculo do cuidado, por questões que fogem ao controle dos profissionais envolvidos. “Os psicólogos precisam lidar com as limitações dos contextos no qual o acompanhamento vai acontecer. Não raramente, é possível iniciar o acompanhamento no ambulatório/consultório e, diante do agravamento da doença, o paciente precisar de uma internação para controle dos sintomas em outra instituição. Dependendo da logística, pode haver uma interrupção do suporte, com a perda do seguimento. Pode ser bem frustrante no sentido de não ser possível dar continuidade àquele vínculo terapêutico”.
Além disso, há também a possibilidade das pessoas assistidas pelo cuidado optarem por impedir o fluxo planejado de informações, a fim de evitar sofrimento. “A intervenção também se faz necessária em situações de conspiração do silêncio, quando não há concordância entre paciente, família e equipe sobre o que deve ser compartilhado. Muitas famílias, na tentativa de evitar o sofrimento do paciente frente às notícias difíceis, podem tentar impedir que ele tenha acesso às informações sobre a sua situação. Nesses casos, é importante não criar um embate com os familiares, mas acolhê-los, buscando entender quais as preocupações existentes em relação ao fato de o paciente receber informações sobre a evolução da doença. Isso remete ao entendimento de que a família é uma unidade de cuidado sendo, portanto, afetada por todo o processo” revela Silvana.
Uma forma de trabalho para cada fase do cuidado
À medida que a doença avança, os familiares, assim como a equipe que lhes prestam cuidados, devem adequar a forma de trabalhar não apenas a comunicação, mas o cuidado em si. Essa identificação se torna essencial. “As fases da doença podem ter demandas diferentes. O mais importante é realizar a escuta das necessidades e, dessa forma, planejar os cuidados. Pacientes e familiares podem ter demandas que precisam ser acompanhadas e, sempre que possível, compartilhadas”, diz Kovács. A ideia da professora livre docente do Instituto de Psicologia da USP é semelhante a de Silvana. “Nas fases iniciais é importante priorizar a intervenção junto ao paciente, num momento em que ele se encontra com melhor funcionalidade, com a autonomia mais preservada e necessita de um espaço de escuta que permita a assimilação de sua realidade. Assim, podemos identificar seus vínculos mais significativos, que numa fase posterior devem ser igualmente cuidados e orientados frente aos papéis que assumem com a progressão da doença.
No fim da vida, quando o paciente se mantém lúcido, deve-se preservar um espaço para a expressão de seus sentimentos e para os fechamentos necessários”, detalha a membro do Comitê de Psicologia da ANCP, que atende uma média de 80 pacientes mensalmente junto à sua equipe multiprofissional.
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